CANNES, HÔTEL LE PAVILLON DE MADRID
Maria S. Mendes
CANNES, HÔTEL LE PAVILLON DE MADRID
(com a voz de Klaus Mann)
sobre a noite antiga e amarrotada
o ferro das horas passaja e nem por isso
alisa o que nela são vincos fundos
endireito um pouco o roupão ajeito
a gola larga penteio a franja com a mão
(onde o copo acre prò tchim-tchim?)
nem paz nem pai nem país porém
capaz ainda de sorrir ao luzeiro da marginal
que este mar reproduz e multiplica
bijuteria que não aceitam no prego
PORTBOU, HOTEL DE FRANCIA
(com a voz de Walter Benjamin)
escarpas dão para o anil do mar
o meu olhar derrui para o céu naval
tudo o mais: cinza e lodo e unto
e a fadiga muda com que pronuncio
o doloso auspício de ficar
podem armar o futuro (um qualquer)
erguer outro edifício onde este está
vestir o defunto desinfectar o colchão
não voltarei a fugir.
por pagar, em pesetas:
- - - - - - - - - - - - - - dormida e jantar
- - - - - - - - - - - - - - 5 gasosas c/ limão
- - - - - - - - - - - - - - 4 telefonemas
- - - - - - - - - - - - - - morfina
(que o Anjo pague a conta)
Miguel-Manso
Miguel-Manso nasceu em Santarém, em 1979. Viveu em Almeirim e em Lisboa. Hoje mora numa aldeia do concelho da Sertã. Estreou-se em 2008 com o livro Contra a Manhã Burra (edição do autor) e fez sair no mesmo ano Quando Escreve Descalça-se (edição Trama Livraria). Em 2012 publicou Aqui Podia Viver Gente, com ilustrações de Bárbara Assis Pacheco (Primeiro Passo). Em 2013 publicou Tojo: Poemas Escolhidos (Relógio D’Água) e Supremo 16/70 (Artefacto), e em 2015 Persianas (Tinta da China).