There is nothing wrong with my sister
Maria S. Mendes
There is nothing wrong with my sister
After you told my sister
that there was no one else
but you no longer wanted her,
she went to bed and tried to work out
what she had done
and what was wrong with her
and spent the night awake.
There is nothing wrong with my sister
but may there be something wrong
with the Ikea wardrobe
she helped you to build,
so that tonight it falls apart
and wakes you
from your unaccompanied sleep.
Lorraine Mariner, “There is Nothing Wrong with my sister”, Furniture. London: Picador, 2009.
Gosto deste poema porque já desejei secretamente que a minha mobília do Ikea caísse em cima da pessoa que ficou com ela. Gosto deste poema porque nele se defende uma pessoa e se acusa outra, arquitectando-se uma forma de vingança a quem a merece, que fica para sempre inscrita nestes versos. E gosto deste poema porque expressa bem um certo tipo de poesia, na qual, nas palavras de Sianne Ngai, “Delightfulness offered by cuteness is violent”. Em Our Aesthetic Categories, Ngai relaciona o conceito de “cuteness” com alguma poesia moderna, de modo a mostrar como certos poemas usam características como “smalness, formal simplicity, softess or pliancy” (HUP, 2012, 64) para representar situações que não são “neither precious, small or safe” (70).
“There is nothing wrong with my sister” não é um poema difícil de ler, recusando abertamente a ideia de que a poesia deve ser entendida como uma adivinha ou como um texto que esconde uma mensagem apenas para ser compreendida por algumas pessoas. Nem poderia ser demasiado difícil, note-se, pois não sabemos quão bons são os talentos hermenêuticos do namorado da irmã. O poema é uma mensagem, à semelhança da nota sobre ameixas de William Carlos Williams em “This is Just to Say”.
A escolha de um roupeiro do Ikea – o símbolo de um tipo de mobília que não é pensada para durar – pode dizer algo sobre as relações do namorado da irmã, ao mesmo tempo que este é colocado na posição de duvidar se será seguro dormir ao pé do móvel, transformando-se este objecto em algo potencialmente perigoso. Note-se ainda como alguns dos versos descrevem a situação da irmã da poetisa, mas também as dificuldades de quem tenta montar algo do Ikea: “she went to bed tried to work out /what she had done / and what was wrong with her / and spent the night awake”. Expressões como “tried to work out” são associadas à ideia de que o problema não se encontra na mobília, mas sim em quem a tenta, sem sucesso, encaixar, abandonando a tarefa ao final de algumas horas e ficando a pensar em qual terá sido o passo errado na montagem. Se assim for, o título do poema, repetido na segunda quadra, pode ser ainda uma alusão aos problemas de montagem dos móveis do Ikea.
Lorraine Mariner usa a forma para dar um tom ao poema. Assim, apesar de as duas quadras partilharem, ao estilo de tanto mobiliário do Ikea, o tamanho, a mensagem bem-humorada torna-se ligeiramente mais agressiva quando o padrão rítmico dos primeiros versos é interrompido nos últimos versos de cada quadra, como se o poema estivesse a fazer duas coisas ao mesmo tempo: por um lado, a repetir o modelo da relação da irmã e de quem monta um móvel do Ikea, em que tudo começa bem, mas logo enfrenta dificuldades; por outro, a descrever de um modo ligeiro uma situação que se torna num aviso (cuidado com o guarda-roupa) e numa forma escrita de vingança (todos saberão o que fizeste à minha irmã). “There is nothing wrong with my sister” é, assim, um poema claro, ao contrário das instruções que acompanham cada móvel e dos sentimentos de dúvida que o namorado da irmã lhe deixou.
Maria Sequeira Mendes
Maria Sequeira Mendes é professora na FLUL e colabora com o Teatro Cão Solteiro.