One Art
Maria S. Mendes
One Art
The art of losing isn’t hard to master;
so many things seem filled with the intent
to be lost that their loss is no disaster.
Lose something every day. Accept the fluster
of lost door keys, the hour badly spent.
The art of losing isn’t hard to master.
Then practice losing farther, losing faster:
places, and names, and where it was you meant
to travel. None of these will bring disaster.
I lost my mother’s watch. And look! my last, or
next-to-last, of three loved houses went.
The art of losing isn’t hard to master.
I lost two cities, lovely ones. And, vaster,
some realms I owned, two rivers, a continent.
I miss them, but it wasn’t a disaster.
—Even losing you (the joking voice, a gesture
I love) I shan’t have lied. It’s evident
the art of losing’s not too hard to master
though it may look like (Write it!) like disaster.
Elizabeth Bishop, "One Art", The Complete Poems 1927-1979. NY: Farrar, Straus & Giroux, 2008.
© 1979, 1983 Alice Helen Methfessel
“One Art”, um dos poemas mais conhecidos de Elizabeth Bishop (1911-1979), foi feito de propósito, no fim de 1975 ou no princípio de 1976. Quem está habituado reconhece-lhe regularidades que não podem ser produto do acaso ou da natureza. Sem dificuldade identifica cinco tercetos e uma quadra; e versos de cinco pés com uma sílaba breve e uma sílaba longa. A rima sugere também deliberação. São usados dois refrães e duas rimas (A e B). B só ocorre no segundo verso de cada estrofe. Partes do primeiro e do terceiro versos do primeiro terceto ocorrem, um de cada vez, em cada estrofe até à última, onde voltam a ocorrer ambos.
Elizabeth Bishop defende em “One Art” a tese de que “the art of losing isn’t hard to master.” A tese não é verdadeira. Não pode ser fácil, nem decerto difícil, aprender a perder coisas, ou ensinar a partir uma perna, ou descobrir o contrário de “marido”, ou comprar √2 limões. Não vale porém a pena explicar as diferentes razões. A quem o faríamos? Elizabeth Bishop, que poderia emendar o seu poema, não terá querido fazê-lo; e de qualquer modo não pode beneficiar já das nossas explicações.
A inconsistência de uma tese quase nunca importa num poema. “One Art” tem outros méritos. Os maiores são o metro, a rima, e aquilo a que com licença podemos chamar desembaraço. A qualidade da nossa relação com um poema depende do modo como conseguimos chamar a atenção para aquilo que nele nos parece meritório. Normalmente o mais meritório não é o que é dito. É uma verdade comum a todas as artes, que só o facto de detectarmos em poemas coisas que se parecem com palavras e frases nos faz esquecer. Chamamos a atenção para os méritos de um poema como chamamos a atenção para as particularidades de qualquer coisa. Traduzir um poema é um modo de chamar a atenção para o que nos parecem ser as suas particularidades.
Um outra
A outra lousa tem muito ar de mestra
Tantas coisas todas cheias de intenção
Partir a lousa não nos estraga a sesta.
Uma lousa por dia aceita a festa
Parte as chaves e ganha a hora em vão
A outra lousa tem muito ar de mestra.
Pratica, parte a lousa e fá-lo lesta
A praça o nome e a excursão
Ao norte. É pouca a lousa, e é modesta.
Parti a cigarreira e não me resta
Nenhuma das três casas na prisão
A outra lousa tem muito ar de mestra.
Parti duas cidades mera fresta
Do reino, dos dois rios, da contenção
Lamento mas é só coisa modesta.
—Mesmo sem ti (a voz sagaz a gesta
Que estimo) é mesma a minha opinião:
A outra lousa tem muito ar de mestra
Parecendo (escreve lá!) coisa modesta.
Miguel Tamen é professor no Programa em Teoria da Literatura da Universidade de Lisboa. O seu último livro (com António M. Feijó) é A universidade como deve ser (2017).