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Poemas Yeng Pway Ngon

Singapura

Poemas Yeng Pway Ngon

Maria S. Mendes

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Yeng Pway Ngon é um autor prolífero, com 26 volumes publicados de poesia, ficção, ensaio, teatro e crítica literária. Em 2003, o autor venceu o Cultural Medallion for Literature e o South-east Asia Write Award (SEA Write Award). Pway Ngon recebeu ainda o National Book Development Council's Book Award em 1987-88, e foi vencedor do Singapore Literature Prize em 2004, 2008 e 2012.Em Singapura, falámos com Yen Pway Ngon sobre o seu talento em escrever vários géneros, o seu primeiro prémio, as razões por que escolheu publicar em Taiwan, a imagética dos poemas e a importância da verdade. Yen Pway Ngon autorizou-nos também a publicar dois poemas da sua edição de Collected Poems, ‘Café’ e ‘Missing’


Ausência, versões de Sónia Oliveira

Eu estava confuso na altura
mergulhei na melancolia, resguardei-me
na bebida, 
na verdade, apenas
para tentar camuflar as minhas velhas
feridas

arrasado

escreveste-me um poema. eu percebo
estás cansada de tudo isto
para ti chega, estás farta de fugir da morte e perto 
de a conhecer. 
sozinha. na verdade
durante muito tempo
ignoraste
os embates sangrentos, os largos caudais de sangue
infelizmente este velho inimigo não consegue ainda
esquecer como eras
o teu corpo

tatuado

a noite está ventosa
sento-me e cubro-me com o casaco. vêm-me
à mente os teus gracejos um pouco ébrios, lembro-me
que há imenso tempo não leio a tua poesia
penso em ti aí —
na tua noite que agora
é mais negra, mais profunda... 

penso que devia escrever-te um poema
mesmo que há muito tenhas deixado 
de me escrever poemas; mesmo
que possas vir a lê-lo
ou não

escrevo-te um poema
mas não tenho nada para dizer, apenas
que ainda é tão fácil sentir-me
emocionado, ainda é tão fácil
desfazer-me em lágrimas de raiva. sobretudo
no preciso momento
em que te escrevo um poema. 

8 de Novembro de 1983, manhã

 

Missing

I was confounded
and fell into moping, even flirted
with heavy drinking, really simply
trying to camouflage my old
sores

you wrote me a poem. i understand
you are tired of all this
you are done, fed up of being on the run, about to
disappear incognito. in fact
for a long time
you haven’t cared about
the bloody clashes, or those riverfulls of red

regrettably this old enemy
still cannot
forget the old you
your body
your tattoos

tonight the wind is high
i sit up, pull on my jacket. suddenly
I think of your tipsy banter, think of
how it’s been so long since i’ve read your poetry
think of you over there -
your night, which now
is darker, deeper…

think of how I should write a poem for you
even though you have long run out of poetry
for me; although
you may see it, although
you may not

i write a poem for you
but have nothing to say, just to say
i’m still so easily
moved, still so easily
reduced to angry tears, especially when
in the middle
of writing a poem for you.

8 November 1983, morning

Yeng Pway Ngon, ‘Missing,’ Poems, translated by Alvin Pang, Judith Huang, Goh Being Choo. Singapore: The Library Centre, 2012.


café

 

Então uns começam a agitar as pernas
outros atropelam-se na vozearia,
            alguns mexem o café,
outros vão tomando infindáveis limonadas
outros fumam
outros não fazem nada de especial

(o Anthony, cauteloso, menciona o tempo que faz nessa manhã
Maria parece estar bastante contente)

 

é assim que resvalam para um lugar escuro
do qual não receberam nem mapa nem chave
e cuja porta
continua por abrir

 

ou seja: não há aqui poder da flor
eles não têm nenhuma missão
nem estão sequer a perder tempo

 

(o Anthony, cuidadoso, alude ao tempo que faz nessa manhã
Maria parece estar absolutamente encantada)

 

a questão é que algumas espécies de flora precisam
            de escuridão para rebentar
ou para dar flor e dar fruto
ou talvez nunca tenham sido capazes de coisa alguma
seja como for a porta ainda está por abrir

(o Anthony, discreto, refere o tempo que faz nessa manhã
Maria parece estar completamente fascinada)

 

entretanto muitos sapatos percutem pelas ruas
e muitas janelas abrem-se para o aço e para o betão
e as calculadoras mergulham no seu afã de teclas

 

(o Anthony, vago, aflora o tempo que faz nessa manhã
Maria parece transbordar de alegria)


23 de Abril de 1968

 

 

 

 

 

Cafe

And some begin to shake their legs
some jabber at the top of their voices
some stir their coffees
some sio endlessly their lemonades
some smoke
some do nothing much at all

[Anthony cautiously brings up the morning weather
Maria seems perfectly happy]

this is how they slit into this dark place
to which they have been given neither map nor key
and the door
has yet to be opened

put it this way: there is no flower power here
they are not on some assignment
nor are they wasting their time

(Anthony carefully alludes to the morning’s weather
Maria looks utterly delighted)

it’s just that some species of flora need to be kept
in the dark to sprout
or flower or bear fruit
or perhaps have never been capable of anything
at any rate the door has yet to be opened

(Anthony discreetly mentions the morning’s weather
Maria appears completely ecstatic)

meanwhile many shoes drum past street after street
and many windows open on steel and concrete
and calculators busy themselves squabbling

(Anthony casually broaches the morning’s weather
Maria is apparently overcome with joy)

23 April 1968

Yeng Pway Ngon, ‘Missing,’ Poems, translated by Alvin Pang, Judith Huang, Goh Being Choo. Singapore: The Library Centre, 2012.


Sónia Oliveira nasceu a nove do nove de setenta e dois. Publicou o livro de poesia antenas em 2012 e, antes e depois dessa data, vários poemas e contos nas revistas EufemePiolhoDiVersos – Revista de Poesia e Tradução;nas revistas online PreguiçaDiversos Afins(Brasil) e Minguante; na antologia de poesia visual poemavisual.com.br; nos fanzines Debaixo do BulcãoMilk and Wodka(Suíça) e Flanzine; e na folha de poesia Nem Só de Gin Vive o Pinguim
Ainda no decurso do corrente, sairá do prelo o livro de poesia Ponto e Vírgula.
Traduz para viver e mantém, desde 2006, o blogue triplicado.blogspot.com.