Éme, Sebastião Belfort Cerqueira
joana meirim
E que foi só desta vez
Que saiu mal.
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E que foi só desta vez
Que saiu mal.
Read MoreSe vieres por mim, não levantes a mão
para me chamar – na casa onde nasci,
a minha mãe contava as dores pelos
dedos do meu pai e dizia que levantar
a mão era desculpa de quem vinha com
a doença do amor. A minha mãe – um
Read MoreOs mortos parecem estiolar como um lírio branco à entrada da noite.
Mas metem-se na solidão das casas, em livros, em gavetas.
Levantam as poeiras, têm rastos semelhantes a caudas de cometas.
Deles emana fósforo, uma ligeira vibração no espaço.
Read MoreAs if in moving even meekly
Read MoreUm outro nome que não seja solidão
Um outro nome que nos distraia das nódoas,
que nos faça cair de pé como os gatos
Read Moresuponho
que uma parte
é sempre
maior do que a outra
poucas regras perdurarão
mais duramente
quando for tempo
sacudiremos a areia
dobraremos as toalhas
e eu mergulharei no mar
uma última vez
enquanto tu
mudas
o fato-de-banho
Read MoreSara & André são artistas plásticos e nasceram em 1980 e 1979, em Lisboa, onde vivem e trabalham. Estudaram, respetivamente, Realização Plástica do Espetáculo na Escola Superior de Teatro e Cinema (Lisboa, 1999-2005) e Artes Plásticas na Escola Superior de Arte e Design (Caldas da Rainha 1999-2005). Expõem regularmente desde 2006.
Read MoreChampanhe
Na noite em que inventaram o bagaço
Vim a saber depois
Pensaram em nós dois
Na noite em que inventaram o bagaço
Como que por magia
Sabiam que eu havia
De o usar pra puxar o lustro ao espaço
Até os olhos doerem de brilhantes
Porque goste-se ou não
É assim que as coisas são
E nunca voltam a ser como eram
Dantes.
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Caminho
Nos longos troncos,
a hera cresce.
Pelos rochedos acima,
a hera alastra.
Esgueiram-se nas fissuras, as lagartixas.
Presas ao alto,
as tranças das mulheres.
Sujos de pó,
os casacos dos homens.
Passeiam-se pelos campos, os bois.
Vivos, animados e amenos,
todos.
Read MoreFalabamos
e a conversa semellaba un iglú
un fío branco
un tecido vexetal
unha cúpula
Read MorePOLÍTICA (um projecto)
nenhuma colagem
à esquerdaàdireita
*
fazer de mulher
ser de ninguém
*
o século passado
é demasiado novo
*
um primeiro-ministro
depois da meia-noite
*
todos os dias há
acasos novos
*
comover climas
comprar tempo
*
pesagem é tudo
o resto é paisagem
*
página a página
escrever branco
*
o amor a um torso
não tem solução
*
pequena política
dizer não dizer
*
um dó sustentado
emoção ne varietur
*
o som dos votos
a caixa das esmolas
*
triste cidade
sem reforma
*
cai o pano
e o salário
*
de quem serão
as horas dos outros?
Ricardo Tiago Moura
Ricardo Tiago Moura nasceu em Coimbra, Junho de 1978. Publicou os livros Um gato para dois (Hariemuj, 2013), Epístolas a D. (não edições, 2013), 1 gato para 2 (não edições, 2015) e pequena indústria (Tea for One, 2016). Publicou também o livro-objecto Controlo de qualidade (ed. de autor, 2017). O seu livro Espaço aéreo (Arqueria, 2014) foi publicado no Brasil, mais tarde traduzido para Espanhol e Inglês e publicado no Peru (Amotape Libros, 2015) e Reino Unido (Carnaval Press, 2017). Tem publicado dispersamente poemas em revistas e antologias. Dedica-se também à colagem. Vive em Køge, Dinamarca.
João Paulo Esteves da Silva (músico, tradutor, poeta). A relação da vida com a poesia divide-se, de facto, em quatro fases. Dos quatro aos 10 anos, fazia versos para diversão da família e visitas, sentindo nestas exibições uma vergonha só comparável à exibição pública forçada das partes genitais. Dos dez aos vinte, descobriu as estratégias e os engenhos que lhe permitiam esconder-se atrás da linguagem e escrever textos surrealistas ou "nonsensicos" onde ninguém o poderia apanhar despido e de emoções à vista. Dos vinte aos trinta entrou num buraco negro à procura da música perdida, pelo que não escreveu uma única linha. Dos trinta em diante, após ter encontrado uma passagem entre a música e a linguagem, vem escrevendo poesia de forma obsessiva, com cada vez menos vergonha, tentando equilibrar o engenho e a nudez emotiva.
Bule
Adília Lopes
“Nenhuma folha bole”
Sophia de Mello Breyner Andresen, “Estações do ano”
Em criança, detestava ir à escola e ir ao dentista. Invejava a minha avó porque não tinha dentes e não ia à escola. Eu achava divertido usar placa postiça.
20-XII-2017
Em criança, a minha mãe deu-me um livrinho de zoologia cheio de imagens coloridas muito apetitosas. É Zoology, Golden Science Guide, publicado em Nova York em 1962. AS imagens da página 100, tinha de ser a página 100, eram as mais apetitosas. Uma é a imagem dos dois perfis em que também se pode ver uma jarra. A outra era a mais apetitosa mas vejo hoje que é sexista. É o reflexo condicionado. No chão, um rapazinho vestido de azul brinca divertido com uma cobra. Em pé, em cima de um banco de jardim, histérica, apavorada, uma menina de vestido cor-de-rosa já sabe que as cobras podem ser perigosas. Tinha de ser: a menina assusta-se, não se diverte; o menino diverte-se, nenhum mal lhe acontece.
20-XII-2017
Pipi das Meias Altas
Estava a almoçar num restaurante em Lisboa e entrou uma dúzia de nórdicos. A empregada que os foi atender disse mais tarde a um colega: “São da terra da Pipi das Meias Altas, não se percebe nada do que dizem”. Achei graça a isto e lembrei-me da Pipi das Meias Altas. Foi um ídolo da minha infância. Fui ao aeroporto esperá-la. Fomos de táxi, a minha avó, uma vizinha da minha idade e eu. No aeroporto, ouvi uma menina dizer: “o meu sonho era andar de avião...” Não vi a Pipi. O meu pai levou-me ao Jardim Zoológico porque a Pipi ia lá. Aí vi a Pipi. Ainda hoje me lembro do ar dela, acho que ia contrariada. Depois vi uma fotografia dela numa revista, talvez na Flama. Estava numa piscina no Estoril. A Pipi já tinha maminhas. Era afinal uma rapariga como as outras, não era o ser fantástico da televisão. Isto fez-me muita confusão, desgostou-me. Nunca mais acreditei em actrizes. Actrizes são pessoas.
26-V-2018
No Vale Abraão de Agustina, não me interessa a Bovarinha nem as considerações sentimentais. Gosto da página sobre chinelos de quarto de Inverno.
8-XII-2017
A tradição oral
Uma alentejana de Brinches, de uma vez que eu estava com soluços, disse-me para eu beber um gole de água e, sem respirar, dizer em voz alta Jesu. Disse para eu repetir esta operação três vezes seguidas. Os soluços passaram. É uma boa receita para os soluços.
23-XII-2017
Praia
Na praia do Estoril, nos anos 60, havia a mulher dos bolos. Era uma mulher vestida de branco que andava com uma caixa grande de madeira ou de lata, já não sei, a vender bolos pela praia. Eu achava a caixa mágica porque tinha prateleiras e bolos nas prateleiras. Não comia bolas de Berlim, as crianças costumavam gostar de bolas de Berlim, mas eu não me dava com crianças, dava-me com velhas, comia barquilhos com doce de ovos. Também havia nozes, bolinhos de ovo com açúcar em caramelo e uma noz dentro. Eu não gostava de nozes, isto é, do fruto seco, gostava do doce de ovos com o açúcar em caramelo. Penso hoje nas mulheres dos bolos. Como devia ser penoso andar assim com a lata dos bolos à torreira do Sol a pisar a areia a escaldar e a aturar fregueses antipáticos.
27-V-2018
A minha mãe
A minha mãe não sabia cozinhar. Nunca cozinhou. A minha avó materna também não sabia cozinhar e também nunca cozinhou. Isto foi complicado para mim. Gosto de me lembrar das torradas que a minha mãe me fazia ao Domingo no fogão. Eram de pão espanhol, também chamado roscas, um pão que havia nas padarias de Lisboa nos anos 60. Muito fininhas e com muito pouca manteiga, completamente derretida. Não gosto de manteiga. As torradinhas era a única coisa de cozinha que a minha mãe fazia.
27-V-2018
Bichos
Lembro-me de todos os animais que tive. Tenho muitas saudades de todos. Quase todos tiveram mortes trágicas e eu isso não aceito, não há consolação para isso. Nos meus momentos mais felizes, penso, acredito que a ressurreição vai acontecer e que eu abro a porta de minha casa e todos os animais que tive vêm a subir a escada, estão vivos e vão entrar em casa e todos cabem na casa e a casa é eterna.
31-XII-2017
A minha gata Lu, quando tinha um pano perto da tigela da comida, puxava o pano com as patas e tapava a tigela. Fazia o mesmo ao meu prato quando eu acabava de comer.
31-XII-2017
Às vezes acordamos felizes, a luz borbulha, escorre
um novelo de cabelos sobre os nossos joelhos e bocas
Sobre as grandes flores fulvas do linho, desbotadas
a manhã desaba
uma canção alaranjada
Um trilho desce
pelas pregas dos lençóis nas tuas nádegas
e eu fico a pensar na forma sonolenta
desses pequenos budas divertidos na penumbra
sorrindo com o picotado de um arrepio
na tua pele (…)
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